21.11.11

Eu. Tu. E o Comissário de Bordo.



Barcelona - Porto - Canárias - Porto - Londres - Porto - Madrid - Porto - Marrocos - Porto - Tenerife - Porto....
A vida dele acontecia mais lá em cima que rente ao chão. Viajava todos os dias para destinos diferentes mesmo que a noite fosse sempre passada entre os seus lençóis, quando regressava a casa no Porto. Apesar de amar o trabalho que tinha conquistado, acusava o cansaço sempre que o despertador tocava às 4:30. Tinha de apanhar os voos das 6:30. Era inquestionavelmente duro.
Ela não adorava a sua agenda, mas sabia desde o início que estar com ele, era estar entregue à incerteza dos horários. As conversas tinham de esperar. Agarrar no telemóvel, porque lhe apetecia partilhar uma qualquer chachada, era coisa que nunca iria existir. Combinar um jantar a dois nunca chegou a ser possível. Mas, aparentemente, tudo valia a pena. Estavam apaixonados e alguns sacrifícios tinham de ser sangrados. Ela abdicava dele durante o dia. Ele compensava-a com amor durante a noite. Estavam incrivelmente rendidos um ao outro. Ela deixou de pensar "são todos iguais". Ele pensou que afinal "não são todas umas complicadinhas".
Era perfeito! Parecia perfeito. Ele passava o dia no ar. Ela passava o dia nas nuvens... E um dia caiu...
Sem palavras, considerações, justificações, mentiras que fossem... nada de nada, ele nunca mais regressou. Nem em corpo, nem nas palavras doces que lhe entregava antes e depois de cada viagem.
Ela chorou. Pensou num milhão de coisas. Nunca o julgou morto. Continuou a saber dos seus passos. Sabia-o bem vivo e de sangue fervente. Um dia acabou por saber o que acontecera.
Ela não ignorava que a vida em alta atmosfera envolvia riscos além das quedas de aviões. Por ali davam-se muitas quedas de coração. Foi o que aconteceu. Apaixonou-se. Apaixonou-se. Apaixonou-se. Ainda parece mentira.
Afinal, todas aquelas viagens não existiam apenas pelos negócios que mantinha pelo mapa fora: apaixonou-se pelo Comissário de Bordo que todos os dias, de sorriso na cara, lhe levava o café em copo de plástico.

Apesar do silêncio, ela nunca o levou a mal. Afinal de contas, cada um usa a saída de emergência que quer.




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