29.9.15

As florestas

Merve Ozaslan



As arverens serem pequenas,
E as florestas serem grandes,
Nós gostaramens de vacas,
Nam curtirames elefantes.


Ora aqui fica este pequeno apontamento, um interlúdio, a esta temática tão fraturante da sociedade atual, de ontem, de hoje e de amanhã: As florestas.

Pois que, meus caros, hoje vos trago este assunto que me tem perseguido nestes dias e que, não podendo ignorar o mesmo, ainda que o mesmo teime em se apresentar a mim de modo ignorante, terei de vos relatar de forma dolorosamente real, ainda que, para menor sofrimento da humanidade em geral, queria eu, acreditem, fosse uma generosa fabulação da minha mente. Não o é.

Comecemos, pois, com o primeiro episódio.
Dou-vos, ainda antes, umas dicas para que o relato não vos caia de chofre no colo, sem qualquer aviso prévio.
Este momento desconcertante mete palavras como: floresta (óbvio), vacas e queijo. Todas juntas, bem entendido seja.

Pois que por estes dias me desloquei a uma dessas grandes superfícies a que os humanos de raça inferior se têm de deslocar frequentemente para sobrevivência da própria espécie: um hipermercado.
Dirigi-me à charcutaria, meti o dedo naquele equipamento que emite uma senha com um número, e, como qualquer mortal (e a beleza de nada nos serve nestes momentos, que pensar, então, da excepcional inteligência) tive de aguardar a minha vez.
E eis que tudo sucede.
Um ser do sexo masculino, acima dos quarenta anos, abaixo dos cinquenta, de compleição física bastante aceitável, e vestuário aceitável para a região do país em que se encontra ainda que não satisfazendo os meus gostos pessoais, assoma-se ao balcão e inicia este diálogo com a funcionária da charcutaria, uma mulher, talvez mais jovem que ele mas aparentando ser mais velha, seguramente ali colocada após sair do complexo turístico de Tires:
- Boa noite, dê-me 200gr desse queijo aí, por favor.
- Deste??? Têm a certeza??? Ai filho, pamórdedeus... Já provou isto?
- Hmmmm... Não, de facto não.
- Até lhe dou um bocado. Tome lá (atirando-lhe uma fatia do dito queijo para as mãos).
- De facto...
- Ainda por cima é mais caro. E essa cor? Amarelinho, hein? Bem bom!!! Credo!!! Já viu este aqui do lado? Ó homem, não leve isso pela sua saúde.
- Bom, já que insiste...
- ´Tá a ver? ´Tá a ver que eu sempre tinha razão? E já viu bem o nome deste queijo? Já viu bem? 'QUEIJOooo DAaaa FLORESTAaaa'. Nunca mais se esqueça deste nome: queijo da floresta.
Diga-me lá: Já alguma vez viu vacas na floresta?
Não, 'né?
Então como é que o queijo há-de ser bom?
Pense nisto amigo, pense nisto.


Bom, eu tinha mais uma pessoa de idade à minha frente e poderia fazer todo um relato sobre o seu pedido de fiambre da pá, mas o diálogo não mete a palavra floresta e eu não quero perder o foco pelo que prosseguirei o caminho que encetei, na certeza de que, a vossa atenção sobre este assunto já estará por esta altura, totalmente, absorvida.
Pois segui-me no próximo episódio.

Hoje, hoje mesmo, numa reunião com um homem que, enfim, sem desprimor para a raça, se apresentou com calças já descidas ao nível do rabo, talvez, diria, sem querer ter medido muito com os olhos, uns seis dedos abaixo do que seria humanamente aceitável. Pois isto descompensa logo uma pessoa de superior sensibilidade como eu. Não obstante, o homem ser uma pessoa tão devota à sua mãe e a um qualquer clube futebolístico cujo animal que o representa tem umas asas, que fez o favor de os tatuar no corpo e oferecer aos olhos dos outros como se de uma dádiva se se tratasse, uma pessoa lá tem de trazer a si o melhor que tem ao nível profissional e, de quando em vez, ir lá abaixo, às grutas húmidas onde estes seres habitam, e tentar estabelecer comunicação com eles:
- Diga-me, então o que o traz por cá?
- Pois, atão, quero mudar o telhado.
- Hmmm... Quer mudar, ou já mudou?
- Não, atão? Quero mudar. Aquele 'tá podre, 'né? Os barrotes, aquilo tudo, ´tá tudo podre.
- Então, está-me a dizer que precisa substituir toda a cobertura, inclusivamente toda a estrutura em madeira?
- Sim, pois.
- E consegue executar todo o sistema de suporte em madeira conforme o existente? Que madeira é que vai usar?
- Madeira? Atão, madeira, vou usar daquela madeira normal.
(baixa em mim aquela mulher das cavernas que todos trazemos no ADN mas que teimamos em arrumar debaixo de uns sapatos Prada)
- Ó homem! Madeira normal? O que é que é madeira normal? JÁ VIU ALGUMA FLORESTA DE MADEIRA NORMAL???
- Pinho. Ou casquinha.
- Ah bom, chiça. Agora madeira normal!!! Ainda me há-de dizer que gaita de árvore é que dá madeira normal. Vai ao carpinteiro e diz o quê? "Olha pá, dá-me aí um barrote de madeira normal"??? 
Já se está mesmo a ver que só vai sair daí asneira. Se ainda nem começou já vai assim, quando acabar... deve lá ter asnas em amianto!

E pronto, depois desencarnou o espírito mau que, uma vez por hora, baixa em mim.
Por esta altura já estou recomposta, já estou branda e serena, pronta para limpar estes pensamentos.
Sonharei, seguramente, com uma qualquer floresta deste país, do mundo quiçá, mas não queira Deus que eu sonhe com aquele vale renegado que encerrava o fundo das costas do homem das asnas em madeira normal, porque, a bem dizer, já tive a minha quota de obscuridade por hoje.



24.9.15

Égoïste




Gostava de me voltar a cruzar com todos os homens com quem já estive e dizer-lhes:

Agora 

estou 

assim.



16.9.15

Reverso





Este gelo que te adormece os pés

Não é o mesmo que te entorpece o coração




15.9.15

Se me disseres o que sentes




Se me disseres como te sentes hoje,
Talvez te ajude.

Talvez te permita pousares a cabeça em mim.
Entrares-me nos caminhos dos meus pensamentos.
Descobrires-me as negações.


Se me disseres o que sentes por mim.
Talvez eu retribua.

Talvez te permita tocares-me o olhar além dos olhos.
Colheres-me a alma e arrebatares-me o pulso.
Desfazeres-me os temores.


Se me disseres que não viverei sem ti,
Talvez morra.

Talvez decida não decidir.
Talvez desista de ti mesmo sabendo que isso me salvaria.
Talvez prefira morrer a arrepender-me.


Se me disseres que algum dia não viverei sem ti,
Então estas palavras que agora escrevo, já as escrevo sem vida.


13.9.15

#quemnãopedenãoouvedeus # quemnãochoranãomama #ofereceram-meunssapatossóporquesim(porquesouumaquerida)



Quem não chora não mama e eu lá ganhei uns sapatos, merecidíssimos, entenda-se!, após as férias epopeicas deste ano.
Foi apenas o reconhecimento de um esforço, de um sacrifício. Chamemos-lhe, um bombom.


[Começo a trabalhar segunda-feira, com a graça do Senhor. O ballet está quase a recomeçar e continuo a perder peso. Portanto, está tudo encaminhado para um regresso à normalidade. Nada temeis. Lá para terça-feira já escrevo poemas sobre cortar os pulsos e fica tudo com dantes.]




9.9.15

#fériasdeverão #queroroupaaaaa #pinterest #SOCORRO

Qiu Yang



Quando tenho pouco dinheiro que são cerca de 360 dias por ano é quando me apetece mais consumir. E por consumir refiro-me a comprar bens supérfluos, que é como quem diz, e não vou andar com rodeios, roupa e acessórios.
Há precisamente três anos entrei nessa grande missão de eliminar o excesso, de limpar o guarda roupa, de dar tudo o que tinha a mais e não usava e, a partir daí, comecei a comprar de maneira mais consciente: menos e melhor. Ou seja, menos mas de facto aquilo que queria ter dentro das minhas possibilidades. Esta medida reduziu muito o número de peças de roupa e de sapatos do closet mas continuo a fazer as limpezas de roupa a cada início de estação e a deixar partir aquilo com que já não me identifico.
Estas duas semanas de férias foram destinadas a isso mesmo estava farta das Maldivas. Renovar o quarto e o closet (queria uma cena à Pinterest... não perguntem) e, necessariamente, libertar-me de bens materiais.
Consegui o quarto e o closet à Pinterest (tenho os cabides toooodos iguais, branquinhos, e até a minha roupa parece saída de um blog de moda, qual Rachel Zoe) mas, e a agora vem a parte perniciosa da coisa... sinto um instinto consumista tão maior, tão grande, tão avassalador a crescer dentro de mim! SOCORRO! Quero roupa nova!

Mas o dinheiro acabou-se em tinta, cabides brancos, cómodas MALM e prateleiras, pelo que o dilema transformou-se num assombro à minha pessoa.
Com uns quilos a menos, a roupa a sobrar-me dos lados (mas que não dei porque o que vai também pode voltar) com um refresh na imagem e diria até na alma (é bonito e profundo mas tinha de contar mais do que agora se mostra apropriado) apetecia-me mesmo era mudar o guarda fatos todo. Queria renascer noutras roupas.
Ai que merda.
Não gosto de ser assim.
Quer dizer, gosto tanto, mas sei que é socialmente condenável.
E isto levou-me a outros pensamentos.
Levou-me à ideia - estúpida e oportunista - de que há muito, muito tempo, que ninguém me oferece nada. Não sei muito bem se será difícil agradar-me ou se, simplesmente, nem se lembram de me oferecer alguma coisa mas senti um certo adormecimento, seguido de um certo lamento, por não ter um presente deixado debaixo da almofada, só porque sim. De não ter um bonito par de sapatos à minha espera, embrulhado numa fita de seda vermelha, só para me fazer sorrir. De não receber um vestido, mesmo que num saco de papel só porque "vi e achei que era a tua cara e decidi comprar-to".
Mas gostamos todos disto, não gostamos?
Estava aqui a questionar-me se estou a ter apenas o retorno daquilo que sou com os outros mas neste campo não me parece que esteja a ser feita justiça porque eu sou o tipo de pessoa que compra para oferecer aos outros só porque sim, só porque me lembrei e achei que iam gostar, mesmo fora das datas comemorativas.
Sim, é um choradinho.
Eu merecia um presente. Um qualquer. Daqueles que são comprados só porque a pessoa se lembrou de nos agradar.
Porra, isto é falta de férias...

Bem, mas voltando ao assunto inicial, que era a falta de dinheiro, a vontade de comprar roupa maior que mandar chocolate negro directamente para as veias, e a renovação do quarto e do closet pelas minhas próprias mãos durante as férias, tenho a dizer-vos uma coisa e a aconselhar-vos outra:

1º - Não nasci para criada, nasci para princesa. Que se fodam os DIY do Pinterest. NUN-CA-MA-IS.

2º - Se não nasceram ricas, casem com um gajo rico. É que só há duas maneiras na vida de lá chegar, e uma não está nas nossas mãos mas a outra...



A inspiração. Olho para isto e ainda sinto a dor nos braços. Os meus pulmões ainda andam a expelir pó. A minha pele ainda anda a recuperar dos hematomas. E, sinceramente, agora olho para isto e só me apetece é mudar de casa.



7.9.15

Catarina



Separa-nos a distância,
Uma vida,
Tantas vontades.
Queira Deus,
Ó Catarina,
Que nos reencontremos,
Num destes dias,
Entre sorrisos,
E abraços,
Contigo mulher,
De carácter forte,
Plena de coisas,
Para me contares.



[À minha afilhada maior, mais velha, mulher feita, e que me faz sentir também velha, ausente, e com vontade de ser melhor para os outros. 
Sem saberes, Catarina, deste-me a maior das lições nisto de, perante Deus, assumir a responsabilidade de guiar alguém na vida cristã: a lição de assumir apenas um compromisso que se esteja à altura de comportar. 
Contigo não me tenho portado à altura, mas tens-me ensinado a não falhar como os outros que se te seguiram. Aqueles a quem não consegui dizer não, porque também os amo, aqueles onde vi uma oportunidade de me redimir como madrinha, como orientadora para uma vida cristã.
Obrigada Catarina, apesar de não saberes porquê.]