29.4.14

O toureiro

Edouard Manet



Era bonito o toureiro,
Que não sabia tourear.
Fugia de cornos e bestas,
Apreciava outras festas,
De bailes e cortejar.

Dançarino sem capote,
Enchia o peito sem arfar.
Ladeava bem as moças,
Cortejava as raparigas,
Convidando-as a dançar.

De cabelo bem aprumado,
E olhar de matador,
Encurralava as mocinhas,
Atirava-lhes com as farpas,
Caiam belas em esplendor.

O toureiro sem jaqueta,
Arrastava multidões.
Reconheciam-lhe o talento,
Na dança do acasalamento,
Era mestre de ilusões.

Mas as muitas mulheres traídas,
Cansadas de tanto sofrer,
Esperaram-no no curral das suas vidas,
E sem medo todas juntas gritaram:
"Um dia o toureiro há-de morrer".


[Porque hoje é o Dia Mundial da Dança]

23.4.14

Relações: esse Adamastor.




Hoje, ao falar com um querido amigo, tive de parar pensar neste drama que é ser-se homem numa sociedade, cada vez mais, emocionalmente manipulada por mulheres. Em que as relações acontecem onde, quando e como as mulheres quiserem. Mother fucker's, onde andavam vocês, suas domadoras de leões excitados, quando eu precisava de me encher de coragem para arranjar um gajo e fazer dele gato-sapato?

Pois eu e o meu caríssimo Don Juan da Reboleira, falávamos de gajas (que é do que falamos melhor) e ele mostrava-se, uma vez mais, indignado com o comportamento que as mulheres têm para com ele. Mas comportamento gera comportamento Don Juan da Reboleira, eu já te avisei, que isto de ser putéfia é coisa que já saiu da escuridão das estradas há muito tempo, e vai para cima de uma década que rivaliza com a vossa arte de ser enrabadores de cus alheios.

Bom, mas o Don Juan da Reboleira (DJR, para ser mais fácil) é pessoa que mora no meu coração, naquele cantinho dos filhos-da-mãe que eu queria que tivessem sido mas não foram, mas como vi que até eram umas jóinhas de moços, deixei-os ficar a viver aqui na cave do meu coração. E por essa razão, eu amo - de amizade - as conversas honestas que tem comigo. É um tipo sincero e por isso leva-me sempre o Óscar para melhor actor principal em papel dramático porque, de facto, ele vive as relações com toda a entrega e genuinidade.

Não me alongo mais em elogios e considerações, deixo apenas um brevíssimo excerto da longa conversa que tivemos sobre isto das relações, e de como descobri que uma parte de mim é gajo: o cérebro.



DJR: Buenas!

Eu: Hello Dear!
como tens passado?

DJR: eu vou ter de namorar este ano.

Eu: acho bem que sim, caramba.

DJR: resolução mas não obrigação.

Eu: não percebo porque é que estás sozinho.

DJR: porque sou mau tipo. Mau feitio. Selectivo e desconfiado.

Eu: isso do ser selectivo… até parece que só queres princesas e os outros é que se contentam com lixo.
deixa-te de cenas.

DJR: princesas nada. Não é por aí. Porque senão já tinha.

Eu: então és selectivo em quê?
consegues explicar?

DJR: ora bem… selectivo no sentido que, se vejo que não somos compatíveis, não deixo evoluir ou não me deixo ir.

Eu: mas sabes que há compatibilidades que só se conhecem com o tempo, para o bem e para o mal?

DJR: de certa forma. Mas se noto que não irá dar, mato logo à partida.

Eu: estás assim à espera de um amor à primeira vista, já que à segunda pode logo morrer :)
sê ligeiro nas exigências, ninguém é perfeito, nem mesmo nós próprios.

DJR: eu não sou mesmo mas acho que sou suficientemente inteligente para entender o que querem de mim e largar sem ter de me magoar.

Eu: o que é que querem de ti?... até parece que são todas umas interesseiras.
oh Don Juan da Reboleira, as mulheres só querem amor e que lhes digam que são lindas mesmo quando são uns chaimites. O que gostamos mesmo é de viver iludidas que nos amam.
é só isso.

DJR: querem isso mas não querem dar. Estão muito egoístas.

Eu: Como assim?

DJR: vou-te contar um episódio recente…
Ando a falar com uma rapariga há muito tempo, é divertida, inteligente, mulher de negócios, bonita, atraente...
algumas qualidades.
Um dia demonstrou que tinha vontade de me conhecer e que queria almoçar comigo e abraçar-me…

Eu: e...

DJR: e apareceu… almoçamos, rimos.

Eu: no que é que a rapariga foi egoísta?

DJR: foi simpática, mas não abraçou, não beijou, e eu também não forcei.
depois de ir embora disse um simples gostei do almoço.
E eu disse: “eu também, mas parece que ficaste desiludida”.
ela disse que não, e tal, e que era tímida.

Eu: mas se calhar ficou mesmo desiludida.

DJR: ficou mesmo.

Eu: também pode ter os padrões dela e tu não estares lá.
não sei, estou a mandar para o ar.

DJR: mas que não me enganem e saberei viver com isso.

Eu: mas em que é que achas que ela te enganou?
se calhar perdeu a pica depois de te conhecer.
quantas vezes já fizeste tu isso a raparigas?

DJR: ela disse que tinha vontade de estar comigo, e tal, e foi de férias e continuava na net e sem me escrever.
ou seja: grande vontade...
até que se lembra e pergunta: tudo bem?
eu apaguei e nem respondi.

Eu: mas em que é que achas que ela te enganou?

DJR: porque não foi correta e não me interessa conhecer pessoas assim.
ela ainda enviou mais um sms a pedir para ir ter com ela.
desejei boa páscoa e apaguei o número dela.

Eu: DJR, DJR... tanta psicologia que tu metes nas coisas…
basicamente o que tu queres é poder engatar e dar para trás quando bem te apetecer mas achas inconcebível que alguém te faça o mesmo.
só me parece que ela poderá mesmo ter ficado desapontada ou, simplesmente, fantasiou demasiado e depois, no momento da verdade, as pessoas são diferentes.
já aconteceu a todos.
e tu não percebes, porque custa aceitar que não somos interessantes aos olhos dos outros, mas fazes, exactamente, o mesmo às mulheres.
quando não te agradam tu desligas logo, sem dizer nada.
Matas logo à primeira, lembras-te?
elas nem chegam a saber onde "falharam".
dear... tens de ver o outro lado.

DJR: eu vejo o outro lado e vejo que o que ela fez ou faz é idêntico ao que falas e por ser assim não quero.
azarinho...

Eu: esta conversa é boa demais:
eu pareço o gajo e tu a gaja.

DJR: eu sou gaja nesse aspecto sim.

Eu: epá, eu realmento divirto-me muito a ver como as pessoas querem todas o mesmo mas não se conseguem entender por causa do pensa-que-pensa de cada um.
somos tão complicados.

DJR: então e o que é que achas que queremos mesmo?
ou melhor, no teu mundo e na tua forma de agir, como deveria ser a reacção?
ora conta, perfect girl…

Eu: vai passear com a perfect girl…
Ora vamos lá ver, na minha sabedoria, e o que eu acho, é que ela ia com a cabeça a mil a pensar que ia encontrar o Mr. Perfect :P
como isso não existe, nem em ti nem em ninguém, ela ficou com pouca vontade de avançar. Tal como tu, cortou logo à primeira, também não dá segundas oportunidades... talvez seja mesmo a mulher perfeita para ti :)

DJR: (concordo)
tirando a perfeita para mim, concordo.

Eu: e tu... ficaste com o ego ferido, porque todos queremos que gostem de nós e quando percebemos que isso não acontece ficamos em baixo.
mas a tua maneira de reagir é um bocado exagerada…
a menos que tivesses ficado embeiçado por ela… hmm…
se ficaste, então és tu quem tem de ir atrás.
ela se calhar até está à espera disso.
pode ser matreira, tal e qual como tu, e estar à espera do "deixa lá ver até onde este gajo é capaz de ir por mim"...
e na verdade já mostraste que não queres ir a lado nenhum com ela ou já a terias procurado.
Por isso digo que querem ambos o mesmo porque a desilusão dela é a mesma que a tua mas nenhum está disposto a fazer o que seja um pelo outro.
right?

DJR: right.
so true.

Eu: mas diz lá agora: gostaste dela?
esquece o que veio depois.
gostaste de estar com ela?

DJR: não se gosta em 3 dias.

Eu: mas tu mataste-a logo no primeiro dia, como é que sabes se ias gostar nos dois dias seguintes?



A pequenez





[Só uma pequena nota de rodapé que nada tem a ver com celebrações:

Este blog alcançou hoje as 100 mil visitas.
Apenas hoje.
1170 dias depois de ter nascido.
O mesmo que muitos alcançam em apenas um dia.
Sim, apenas um.

Veja-se bem a pequenez deste inocente que alguns - muito poucos, verdade - creem ser um monstro.
Fica assim claro que ninguém o lê?
Sim?
Que este não é um blog de destruição massiva de sentimentos?
Vá, sem medos.
Aqui estamos só meia-dúzia de nomes sem rosto.
Tudo gente do bem.
Garanto que sim.]



. Tristeza .




A tristeza que nos sobe aos olhos, nem sempre é a tristeza que trazemos dentro de nós.
Podemos ser tristes e reluzir uns olhos audazes.
Podemos sentir-nos vigorosos e arrastar uns olhos tristes.
A tristeza que temos dentro de nós muitas vezes cresce apenas no nosso peito. Contaminando-nos o cérebro. Os pensamentos. Mas não se vê. Ninguém a vê. Há quem pense que nos lê a alma e os pensamentos, quando nos olham nos olhos, mas sabemos bem que aquela tristeza profunda e verdadeira, é aquela que nunca se vê. Aquela que não deixamos que se veja. Que preferimos que definhe dentro de nós. Que nos murche a vida. Que nos seque a esperança. Que nos disseque os olhos, deixando-nos a desmaiar na solidão. Que nos empurre as palavras difíceis de dizer pela boca dentro.
A tristeza é aquilo que nos mata antes de sabermos que morremos.


Há muito tempo que tento compreender o significado da tristeza. Daquela tristeza profunda e duradoura. Daquela tristeza que se confunde com a própria pessoa. Aquela que já não sabemos identificar se é um sentimento ou se é a personalidade. A tristeza crónica. A depressão.
Alguém saberá, verdadeiramente, onde começa uma e se extingue a outra?




22.4.14

No dia em que acabou




Os sentimentos eram tão pequenos,
Que um dia desapareceram.
Foram grandes como um mundo,
Minguaram num só dia,
Até numa mão caberem.

As palavras desconcertadas,
Que todos os dias se esgrimiram,
Deixaram-nos as ideias cansadas,
Fatigadas pelas lutas.
As que não morreram, fugiram.

Diziam todos em surdina,
Que este amor não fecundaria.
Disseram-se tantas coisas vãs,
Mas ninguém lutou para sarar,
As nossas expostas feridas.






15.4.14

Do sangue fugido

Violeta Bubelyte



Podia não ter doído,

Mas fizeste doer.

Preferiste a distância,

À facada.

Ousaste a dor,

Sem armas,

Mutilaste-me com a solidão.

Fugiste de nós,

Do sangue que temos,

Fugiste de mim,

Das memórias que jorro.

Deixas-me órfã,

Desse sangue e de amor,

De alma,

Fugiste do lar.

Evadiste-te de nós,

Para não te encontrares.

Fugiste de ti,

Deixaste-me a

Sós.




9.4.14

Hilda Hilst



[Não resisto a partilhar este poema porque há coisas que gostava de ter sido eu a escrever]



XIX


As mães não querem mais filhos poetas.
A esterilidade dos poemas.

A vida velha que vivemos.

Os homens que nos esperam sem versos.

O amor que não chega.

As horas que não dormimos.

A ilusão que não temos.
As mães não querem mais filhos poetas
Deram o grito

desesperado

das mães do mundo.




Hilda Hilst...  e a sua obra completa.




6.4.14

Um outro homem (Áudio)




Um leitor deste blog, sob anonimato, decidiu pegar num dos textos do Dias Cães e gravá-lo com a sua própria voz.
O resultado é este e eu estou viciada.
Já ouvi mil e quinhentos milhões de vezes.


Agradeço a enorme, a gigante, gentileza e dedicação.




Um Outro Homem


"É errado querer o corpo de outro homem?
Querer ser possuída por outra alma?
Por outra mente.
Será errado querer suar às mãos de um novo amante?
Gemer junto de um outro pescoço.
Sussurrar palavras noutros ouvidos.
Querer que outras mãos me agarrem as coxas.
É errado desejar conhecer a pujança de outro homem?
Saber como me amaria?
Como partilharia o seu corpo com o meu.
Como me olharia nos olhos.
Se olharia sequer?
Será errado querer outro cheiro na minha pele?
Sonhar acordada com os seus lábios.
Desejar as marcas dos seus polegares na minha carne.
Querer que o seu prazer acabe dentro de mim.
Será errado querer ser sua numa solitária noite?

Será errado imaginar que o nosso homem poderia ser outro?

Será errado fechar os olhos e sonhar?"



Podem ler o texto original aqui!