24.5.11

Gays, Bichas e Homossexuais


Gay
(palavra inglesa)
O mesmo que homossexual.
Plural: gays.



Bicha 
(feminino de bichos. f.
1. Qualquer animal de corpo comprido e sem pernas, como a cobra, a lombriga, a sanguessuga, etc.
2. Objecto! ou figura de formato estreito e alongado.
3. Infrm. 
Fileira de pessoas, umas atrás das outras. = fila
4. Fêmea de um animal, em especial de animal doméstico, como a fêmea do cão ou do gato.
5. Pequena peça pirotécnica que arde agitando-se no chão. = bicha-de-rabear
6. Arrecada em forma de serpente.
7. Tubo metálico flexível com aplicações variadas, podendo cobrir e proteger um tubo de borracha para conduzir líquidos (ex.: bicha do esquentador).
8. Tubo de borracha com que se tira vinho pela batoqueira das vasilhas.
9. O mesmo que bicha do conta-quilómetros.
10. Infrm. 
Homossexual masculino. = larilas, maricas
11. Pessoa irada ou de trato difícil.
12. Galão ou divisa (na manga de uniforme).
13. Mar. 
Escaler da fiscalização aduaneira.

14. Mar. Tira de gacheta terminada em sapatilho.
15. Cal. Órgão sexual masculino.
16. Trás-os-M. Cal. Órgão sexual feminino.
17. Infrm. Aguardente.
18. Bras. Serpentina do alambique nos engenhos de açúcar.
adj. 2 g.
19. Infrm. Relativo à homossexualidade masculina.
20. Infrm. Que tem determinadas características que se atribuem à homossexualidade masculina. = abichanado, larilas, maricas



Homossexual
(homo- + sexual
1. Diz-se da relação sexual ou afectiva! mantida entre pessoas do mesmo sexo.
2. Que ou quem sente atracção! sexual por pessoas do mesmo sexo ou tem relações sexuais ou afectivas! com pessoas do mesmo sexo.



Antes de se levantarem as vozes para me chamarem de preconceituosa, homofóbica e outras coisas mais, sinto a necessidade de me defender como ser humano tolerante, que sou - o que acaba por ter a sua graça, de tão contraditório que é - e dizer já que as distinções de géneros surgem da minha necessidade, básica e elementar, de conhecer o significado das coisas antes de falar delas. Agora que já recolhi informação posso preparar-me para estudar o assunto.
E achei que seria útil partilhar... já que anda tanta gente por aí baralhada e a chamar os nomes que não sabe a quem não deve.
Talvez um dia destes também fale de gente ignorante. Ou burra. Ou acéfala. Ou.... ou.... ou.....





16.5.11

O prodigioso terminal de autocarros




Terminal de autocarros - Sete Rios - Lisboa - Dia 14 de Maio de 2011 - Das 20:30 às 22:00

. O sujeito de cabelos compridos anacronizados
. A rapariga do corpete de ganga com atilhos em fita de seda
. As crianças ciganas descalças
. O tipo que descasca um miúda com os olhos
. A sonsa que espera pelo namorado frick
. O japonês com cabelo de mulher
. A velha hippie com problemas de alcoolismo e com falta de dinheiro para a tinta do cabelo
. O tipo giro
. A tipa com estilo
. A miúda com calções pornograficamente curtos
. A preta que veste uns collants de padrão tigresse rosa-choque mas se esqueceu de vestir uma saia
. A loira que lê uma revista cor-de-rosa
. A tonta que já correu os autocarros todos mas ainda não acertou com o seu
. A excursão de adolescentes com problemas de identidade
. Os namorados que se lambuzam
. O rapaz que tem vergonha do beijo de despedida da mãe
. O chinês que quer parecer europeu
. O motorista engatatão
. O preto que ainda não tirou a mão da pila
. A mãe solteira que está farta da sua criança
. O emigrante de Leste que arrasta os sacos de plástico desde o fundo da gare
. O segurança que anda em círculos sem mexer uma palha
. A mulher que me observa porque não sabe porque escrevo
. Os passageiros impacientes dentro de um autocarro
. O velho sozinho com um boné da caça e um colete da pesca
. A dupla de polícias que exibem nádegas tesas dentro das calças apertadas
. A senhora de meia-idade que faz Sudoku
. O brasileiro com a camisola da selecção
. A introvertida que reza para ser ainda mais invisível
. O reformado que passa os dias a vaguear pela gare
. O casal que se odeia e se despede com alívio
. O casal que se beija à chegada e promete amor eterno
. Eu. Sozinha. Com o papel e a caneta.





11.5.11

O corpo ingrato



Há dias assim. Aqueles em que temos a confirmação de que algo não está bem e passamos a saber porquê. Pode-se ficar apático, triste, ansioso, desorientado, aterrorizado, confuso, revoltado, conformado, esperançado. Eu só consigo ficar agressivamente deprimida.
Acho uma filha da putice que o meu próprio corpo me trate assim. Que me dê uma chapada seca, sem que eu sequer soubesse que lutávamos. Que me passe uma rasteira desconhecendo eu que ele me odiava. Que se ria de mim por maldade pura. Que me humilhe. Que me indique o caminho da minha pequenez. Que me reduza à insignificância da minha existência sem ele. Que me lembre que eu nada sou.
Este mesmo corpo que hoje me atraiçoa é o mesmo que tem a capacidade de chorar, o mesmo que se consegue agoniar de revolta, o mesmo que reage fisiologicamente quando sujeito a um choque emocional. O mesmo que sabe o que são as emoções. Estas que agora mesmo estou a sentir.
É nestes momentos, se é que ela existe, que podemos assistir à beleza desta máquina que somos. Que podemos ver os mecanismos e os seus componentes. O seu funcionamento e as suas avarias. Que embevecemos com as inovações e nos intrigamos com as falhas. Dentro de um mesmo corpo existe esta diversidade de "sins" e de "nãos". De milagres e de homicídios. De vírus e de anticorpos. De crescimento e de morte. 
Este corpo, que agora me vira as costas, já me trouxe alegrias no passado, mas agora já não passa de um traidor. Depois de o cuidar, de zelar por ele, de o alimentar, de lhe dar colo, de o exercitar, de o reconfortar, de o educar e de o dar a amar, ele responde-me com arrogância e incita à revolta de todas as suas partes. Mas não tenho tropas para o enfrentar. E ele sabe tão bem disso.
Neste momento... custa-me viver.

Estou farta deste corpo. Este corpo não é para mim. Por isso este corpo não se vende. Este corpo dá-se.





6.5.11

Acherontia atropos



Nome Comum: Borboleta caveira, Borboleta da morte, Besouro
Nome da espécie: Acherontia atropos (Linnaeus, 1758)
Reino: Animalia
Filo: Arthropoda
Classe: Insecta
Ordem: Lepidoptera
Família: Sphingidae
Género: Acherontia



Tenho recebido o anúncio da morte. Todos os dias lá estão, ao abrir da porta, duas ou três mensageiras do outro mundo. Dissimuladas nas paredes, aparentemente moribundas, de quando em vez patinham uns milímetros para chegarem não sei onde. Talvez tentem matar-me pelas costas sem que eu possa aperceber-me. Mas são atraiçoadas. À distância, sinto-lhes o cheiro a enxofre com o qual o pai delas se faz anunciar. Terão de usar de outra estratégia para me levar. 
Tento libertar-me das ditas bestas, cujo o nome me dá asco pronunciar, mas o pânico começa a apoderar-se da razão e as pernas não ajudam. Por mais que tente um convívio pela indiferença, por mais que desvie o olhar para ignorar a sua presença, por mais que erga a vontade de as matar, o medo tolda-me o raciocínio. Receio a sua revolta e o seu contra-ataque.  E há batalhas que não precisam ser travadas para se antever o ser resultado. A morte ganhará. A morte ganha sempre e não me apetece lutar.

As Acherontias apenas vêm anunciar uma viagem. A viagem.





1.5.11

Às velhas mulheres mães




Deu de mamar a seis. Cinco eram seus e a outra, uma menina, era filha de uma vizinha que, tinha o destino traçado, era também sua cunhada. A coitada era seca e nunca havia de deitar uma gota para alimentar a sua cria. Quando se apercebeu de tal infortúnio ficou desorientada. Foi então que, não por se lembrar genialmente de uma solução, mas por outras mulheres o terem feito, foi pedir à vizinha e cunhada, acabada de parir o primeiro dos cinco filhos que havia de ter, para amamentar também a sua querida filha, não fosse o Santo não ter piedade e levá-la desta para melhor. A vizinha, adocicada pela maternidade que acabara de experimentar, nem proferiu palavras. Estendeu os braços, pedindo a criança ao seu colo, e mostrou-lhe o caminho dos seus peitos fartos. A criança mamou sôfrega. Saciou-se. A mãe agradeceu e haveria de voltar nos próximos cem dias à hora da fome.
A mulher que amamentava, coração raro de bondade como havia de mostrar o resto da vida, pariu os restantes quatro filhos e deu-lhes de mamar até perder a forma dos peitos. Deu-lhes alimento à boca e deu-lhes tudo o que pode, numa época de miséria onde o tudo não passava de gestos de carinho e de palavras por não haver tostão para nada. Acompanhou-lhes o crescimento, encaminhado-os nos percursos mais ou menos difíceis; ensinou-lhes o que era uma família e os seus valores e quis que soubessem o que era o amor aos filhos, que também acabariam por ter. Depois dos sete filhos dos seus filhos, vieram mais seis netos destes, que juntando aos genros e noras e netos e netas por afinidade, formariam a família enorme pela qual sempre se entregou. Pela qual sempre se esqueceu de si mesma. Eram mais de vinte aqueles que descenderam do seu sangue. 
Quase no fim da sua vida continuava a contá-los a dedo para ter a certeza da prole que tinha alimentado e para se poder orgulhar dela. Mas os dias minguavam e as visitas à velha mulher também. Já não conseguia contá-los porque os seus descendentes já não se cruzavam na sua vida. Dias houve em que apenas os da casa estavam presentes para se recordar que tudo começara nela. E um dia, quando já não haviam mais dias para subtrair... o mundo acabou para uns... mas havia de continuar, sem sobressaltos, para muitos dos outros.
E nesse dia, em que o chão se abriu para a receber, uma mulher chorou copiosamente a sua despedida. Essa mulher, também já velha e de família criada, nunca esqueceu que a sua vida começou no peito daquela mulher generosa. A mãe de sangue lembrou-a sempre que a sua vida só o era graças à generosidade terna da sua mãe de leite. Essa mulher, que a sua mãe de leite homenageou no nome que deu à sua última filha, não esteve presente nos momentos fáceis da sua vida. Preferiu deixar esses para os filhos de sangue. Mas esteve sempre presente nos últimos momentos da sua vida, como essa sua mãe esteve presente nos seus primeiros. Cumpriu-se um ciclo. Esse ciclo que os seus filhos ingratos ainda não compreenderam e que tanta agrura trás aos poucos que compreendem. E apesar de os saber há muito autistas das suas emoções, hoje só doeu mais constatar isso. 

Porque hoje, essa brava mulher merecia ter sido recordada como mãe, recordo-a aqui também como uma querida avó.