Não percebi logo o que isto era.
Ou talvez minta.
Minto sempre.
Percebi muito bem o que era, logo no primeiro instante.
Conheço-me.
Primeiro aquilo atingiu-me como uma onda que me deixou surda.
Gozei aquele momento em que dói mas dá prazer.
Depois apressei-me a mentir a mim mesma.
Digo-me sempre que não é nada.
Não, não é a primeira vez.
Sei o que é, porque é sempre igual.
Dentro da minha cabeça sei que é alguma coisa.
Aliás, sem muito bem o que é.
Porque me consome.
Porque toma conta de mim, lenta, mas desmesuradamente.
Quando percebo que me tenho de deixar de mentir, já as minhas vísceras foram comidas.
Já só sobraram os restos da imoralidade.
A atormentarem-me.
Hoje, alguma coisa mudou.
Sinto-me adormecida.
É a rendição.
O fim.
Por um lado, é o fim.
Devia sentir alívio. Ou tristeza. Ou nostalgia.
Mas sinto pena.
De mim.
Perco, hoje, isto.
A doença que me salvou.
Não era para ser.
Nunca foi.
Deixo-a ir.
Mas com dor.
Já sinto saudades.
Espero que aconteça, de novo.