13.10.15

Modalidade Olímpica Nacional




Desde as eleições que ando a ouvir, aqui pelos gabinetes do trabalho, colegas meus a ter debates apaixonados sobre o tema.
Na verdade são mais conversas de surdos porque, se eles próprios se ouvissem haviam de perceber que está cada um a falar para seu lado, não ouvem as opiniões uns dos outros, continuam a conversar sem que as frases e raciocínios se articulem num diálogo, não chegam a conclusão nenhuma e, se bem me parece, ninguém quer denunciar o partido que defende mas, pelo sim pelo não, todos falam mal da situação em que estas eleições meteram o país.
Conversa de surdos com muito lume à mistura.
Cheguei rapidamente a esta conclusão do lado de cá da, infelizmente, mui fina divisória do gabinete:

O desporto preferido dos portugueses é: meter lenha.

Podia até passar a modalidade olímpica.
Os portugueses são mesmo, mesmo, bons é a meter lenha e nisto ninguém nos tira a medalha.

E eu aqui a pensar que, se calhar, eu é que estou mal e devia ter mais opinião sobre o assunto - que até tenho - e que devia chegar ali àquele lado e levantar o punho esquerdo e dizer meia-dúzia de alarvidades em tom irado, meter ao barulho as palavras "ladrões",  "aldrabões", "vigarices", "dinheiro", "iguais", "tacho", e a coisa estava composta e eu passava a fazer parte da matilha mesmo que não tivesse dito porra nenhuma. Tal como eles que, espremendo a conversa, também não disseram.
Foi só mesmo falar mal por falar.
Fez-me lembrar aquelas noites de Natal em que está um calor que não se pode na sala mas, como faz parte da tradição, tem de se enfiar lenha a noite inteira na lareira mesmo que aquilo já pareça uma fornalha. Às tantas já nem faz sentido mas continuamos a fazer porque "faz parte".
Aqui é a mesma coisa. Neste meu estimado Portugal - que o é, e não o digo com ironia - temos este espírito tradicionalista de nos agarrarmos a costumes sem sentido e teimarmos em dar-lhes continuidade. Em deixá-los como herança. E isto de meter lenha nos assuntos, qualquer que seja, a par do outro desporto nacional que é ir aos supermercados e centros comerciais aos fins-de-semana, é só mais uma dessas heranças.


[Fátima Campos, muda mas é o nome do programa para "O Recuperador de Calor" ou "A Salamandra" ou "O Lenhador" ou "Portugal a Arder" ou "Vamos deixar de ser parvos e tentar ser produtivos".]



1 comentário:

  1. Li o teu post e acabei a pensar: podia ter sido eu a escrevê-lo (supondo que seria capaz, vá).
    Tenho precisamente a mesma experiência e opinião que tu.
    Um beijo, DC.

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