20.3.12

Os mutilados



O Pedro não tem cabelo. O Sérgio não tem uma perna. O João não tem cérebro. O Miguel não tem dentes. O Henrique não tem pénis. O Cláudio não tem coração. O Rui não tem boca. O Ricardo não tem ouvidos. O Rafael não tem coluna. O Jorge não tem olhos. O Tiago não tem estômago. O Nuno não tem garganta. O Frederico não tem rosto. O José não tem sangue. O Bruno não tem fígado. O Luís não tem pés. O Paulo não tem bexiga. O Gonçalo não tem unhas. O Joaquim não tem apêndice. O Mário não tem nariz. O Marco não tem vesícula. O Nelson não tem língua. O Manuel não tem mãos. O Daniel não tem tomates.


Se todos juntos não fazem um, porque é que me exigem que eu, sozinha, seja completa?

A resposta a isto pode ser simples e facilmente explicada pela psicologia, naquelas questões da falta de amor do pai e da mãe e das imensas exigências  que a sociedade exerce actualmente sobre nós. Essa teorias dão quase sempre para tudo e desculpabilizam grande parte das anormalidades que se fazem e dizem e, sobretudo, desculpam as deformações e desvios de personalidade de alguns indivíduos.
Não ter unhas para agarrar uma oportunidade pode ser visto como falta de empenho, de tenacidade ou, simplesmente, de preguiça. E isso não incomoda terceiros, apenas atraso o próprio. Eventualmente poderá deixar alguém desiludido por notar a falta de vontade e um rasto de desistência. Mas ter falta de tomates já é outra coisa, e sabemos bem o quê! E isso, sim, pode ter implicações junto dos outros. Pode arruinar a esperança de alguém, saber a traição ou denunciar uma cobardia inesperada. Isto pode magoar.  Isso pode revoltar.
Ter falta de coluna vertebral, de cérebro e de sangue mostra como um indivíduo pode ser, efectivamente, mal formado ou ter maus princípios - e até maus fins. Esses são aqueles que, felizmente, até escasseiam e não definem em nada a maioria dos seres humanos. Todos nós tendemos a desprezar estas pessoas e a saber analisar que não valem grande esforço e nem devem pertencer ao nosso grupo de relacionamentos.
Mas o problema não está em ter falta de apenas uma destas coisas. O problema está na falta de auto-análise e reflexão que algumas pessoas têm em relação a isto. Eu nem condeno quem seja desprovido de algum dos órgãos ou sentidos porque eu também não os tenho na plenitude, mas raios!
Que mania temos todos de nós de nos sentirmos no direito de o exigir aos outros. Que altivez é a do homem em querer dos outros a perfeição que ele próprio não alcança?





7 comentários:

  1. Há já algum tempo que venho ao teu blog e me surge a mesma questão indiscreta. Tu tens homens amigos, relações puramente platónicas, com quem conversas a sério?

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  2. Tenho. Claro que sim. Tenho todo o tipo de homens na minha vida. O pai, o irmão, os amigos do coração, os colegas de trabalho, aqueles com quem dormi, aqueles com quem sei que ainda irei dormir, os amigos de patuscadas, os amigos dos desabafos, das tais conversas a sério, os que são simplesmente conhecidos, e até parece que tenho admiradores (uns mais secretos que outros). Sou uma mulher de muitos homens. Sempre nos demos muito bem. Admiro verdadeiramente os homens e aquilo que os distingue das mulheres.
    Agora pergunto eu: porque raio perguntas?

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  3. Às vees dá a sensação que não nos compreendes bem. Mas se calhar sou só eu.

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  4. Não sou homem. Pode ser por isso. Mas acho amorosa essa necessidade que sentes de ser compreendido por mim :)

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  5. Não é isso. Simplesmente sinto que algumas das coisas que dizes não são realmente representativas do meu "género" ou daquilo que eu entendo como sendo a realidade.
    Vemos as coisas de forma muito diferente, parece-me. Mas é algo a que já estou habituado. Estou sempre a discutir com alguém.

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  6. Depois vai ao teu mail.
    (estejam descansado, não lhe vou bater).

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  7. Se eu fosse freudiana diria que a exigência que fazemos aos outros se chamaria "transferência".Ou posso estar equivocada, mas creio que exigimos aos outros aquilo que nos falta.Enfim, penso que assim fazemos por uma eterna insatisfação conosco.Mas é só o meu pensar... Bj

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