16.7.12

O homem que veio da Lua

Ilustração Dias Cães


No dia 16 de Julho de 1969, nasceu apenas uma criança em todo o planeta Terra. 
No dia em que - dizem - o homem foi à Lua.

Na sua aldeia todos ficaram desconfiados. Nunca tinham visto a Maria grávida e, de repente, no dia em que - dizem - o homem foi à Lua, o seu filho nasceu. Coisa estranha esta, de nascer a única criança em mais de vinte anos naquela aldeia, logo no dia em que a Lua ficou mais perto da Terra e o homem lhe conseguiu chegar. Logo no dia em que não nasceu mais nenhuma criança no resto do mundo.
O boato não tardou a espalhar-se: "O filho da Maria veio da Lua".
O miúdo lá foi crescendo com o estigma e as histórias a rondarem-lhe a cabeça e, de tanto insistirem na teoria, até ele começou a acreditar que tinha vindo num foguetão, directamente da Lua, para ser entregue aos cuidados daquela mulher a quem chamava de mãe. Até o miúdo acreditava que tinha vindo da Lua e, com o passar dos anos, passou a comportar-se como tal. E já ninguém estranhava. O miúdo era do mais esquisito que tinham visto. Era mesmo.
Era aluado na escola, não tinha amigos porque orbitava por outros interesses, e nunca teve namoradas por ter a cabeça no mundo da Lua. O miúdo era estranho, todos concordavam. Vivia lá no mundo dele, apesar de nunca ter conhecido outro que não fosse o da sua aldeia. Da sua aldeia e de toda a superfície da sua legítima mãe, que todos os dias continuava a visitar. Lá olhava pela janela, todas as noites, para tentar compreender a sua mãe, compreender-se a si e compreender porque diabo ela o tinha mandado assentar pés na Terra. Mas ele nunca quis ter os pés assentes. Nunca se quis ficar pela Terra. Tão pouco pela aldeia. O miúdo era tonto mas sonhava. E os seus sonhos voavam, sempre em direcção à sua mãe.
Por isso um dia pensou em construir um foguetão e montar-se nele. Recolheu sucata em todas as casas, oficinas e lixeiras. Aprendeu mecânica e astronomia. Inventou instrumentos e traçou rotas. Desenhou um fato e ensaiou viagens. Estudou este mundo e o outro. Conheceu tudo sem sair do sítio. Cresceu. Ambicionou. Fez. Um dia pensou em construir um foguetão e construiu. Um dia pensou em fugir e fugiu. 
Agora vive na Lua e já nem pensa voltar. Vive sozinho mas com os olhos a brilhar.

Hoje, passados 43 anos desde o seu nascimento, na aldeia todos sabem: Afinal este homem não veio da Lua, afinal este homem é mesmo de outro mundo.


Ao Salvador,
Parabéns.


14 comentários:

  1. Há tanta gente assim, tanta gente que nasceu em noite de Lua Nova, que se foi esconder para ter o seu parto em local ignorado...

    Nascem da Lua e são, necessariamente, diferentes; Selenitas que andam neste mundo que não parece ser deles...

    Texto muito lindo e saboroso...Afinal, todos nós temos um pouco de lunático!

    Bjs

    Raul (luaR)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. LuaR... Surpreendente!
      Nunca tinha reparado.
      Assim sendo, este texto também lhe encaixa que nem uma luva.
      Beijos

      Eliminar
  2. A ilustração está um sonho....parabéns....

    http://confissoesdarosana.blogspot.com/

    ResponderEliminar
  3. Fazes tudo bem pah =)
    A ilustração muito boa e o texto como sempre espectacular!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigada Pedro!
      Mas infelizmente (ou felizmente) não sei fazer tudo bem.
      Ando há anos para conseguir fazer uma cheesecake de morangos como deve ser, mas a receita nunca me sai bem :))))
      BJ

      Eliminar
  4. ( Ouvindo http://www.youtube.com/watch?v=D67kmFzSh_o )

    - Apollo 11 chama Houston
    - Apollo 11 chama Houston, perdão, Évora...))
    - Mensagem recebida. Foi uma honra ter uma das melhores escritoras da blogosfera a dedicar um Post a este simples Astronauta. Obrigado, Noites Caninas...))
    - Um beijo.
    - Over.

    ( http://www.youtube.com/watch?v=1hKSYgOGtos )

    ResponderEliminar
  5. Eis que chegou o aniversariante!
    Muitos parabéns e obrigada pelo imaginário para esta história.

    Beijos.

    ResponderEliminar
  6. Gostei da ilustração.E do texto, é claro!

    ResponderEliminar
  7. Muito bonito o texto e a ilustração!

    ResponderEliminar