6.5.12

A minha mãe



A minha mãe hoje vem visitar-me! Está quase a chegar e ainda não consegui escrever nada sobre ela.
Queria fazê-lo antes que se assomasse aqui à porta mas a urgência em fazê-lo parece deixar-me ainda mais atrapalhada. No fundo, não sei sobre que falar. Queria enaltecer-lhe o feito de ter criado dois filhos num tempo em que se ambicionava pouco para o seu futuro; de ter sido mãe enquanto se desdobrava nos papeis de mulher; dona de casa e fiel funcionária de um patrão tirano e de, ainda assim, nunca se ter esquecido dela própria e de ter lutado pelas suas ambições. É uma mulher do caraças, não há dúvida.
Mas neste momento o choque de gerações que vivemos não permite, ao meu insuflado e jovem ego, tecer-lhe elogios que não venham do fundo do esófago. Muito menos que venham da ponta de língua. Por isso não sei o que escrever. Mas pensando bem há que reconhecer: fez um excelente trabalho comigo e com o meu irmão. Foi e é a mãe que dera a muitos ter.
E isto não tem nada a ver com deixar subentendido "ai que somos os dois seres tão superiores". Não é nada disso. Mas no meio da balbúrdia toda lá estruturou duas pessoas bem resolvidas com elas próprias e com os outros. Educados e com valores morais bem assentes. Respeitadores e ao mesmo tempo tolerantes.
A menos que o meu irmão ande a fazer coisas que eu desconheça, eu acho que ele é mesmo o gajo mais porreiro deste mundo. E isso deveu-se, entre milhares de outras coisas, também à educação que a nossa mãe nos deu.
O meu registo é outro. Não sou a palhaça da aldeia mas também tenho os meus bons momentos. Não sou, ao contrário do meu irmão, aquele pessoa que quando vai à terrinha gosta de cumprimentar toda a gente e dar beijos, mas sou fiel e devota às minhas amizades. Já não me identifico com os costumes e modos das minhas gentes mas sou a primeira a falar das minhas origens. Mais uma vez, creio que a educação que me foi transmitida assim me moldou. Sou do mundo mas sei onde comecei a levantar asas.

Quando vasculho memórias de episódios que me marcaram com a minha mãe, não tenho dificuldade nenhuma em lembrar-me de uma dúzia deles. Foi sempre grande companheira e educadora. Nunca a melhor amiga, que há que saber distinguir os papeis. Ela assim o ensinou.
Mas recordo-me, particularmente, destes pequenos momentos em que, claramente, a minha mãe me passou conhecimentos e ensinamentos que trago até hoje comigo e, com certeza, os levarei para o resto da vida:

1.
(5 anos de idade, no caminho de casa para a creche)
-"Mãe, porque é que se diz "X coisas"? E porque é que existe o "há" com H e o "à" sem H? Mãe, porque é que dizes boa tarde a todas as pessoas que passam por nós? Mãe, quando não tens dinheiro porque é que não passas um cheque?...)
- "Filha, por favor, cala-te um bocadinho..." 
(Mas lá acabou por explicar tudo o que eu lhe perguntei).

2.
(algures na adolescência, enquanto falávamos sobre o futuro e a escolha da profissão)
- "Filha, lembra-te disto: nunca estejas dependente de um homem para comprar um par de meias".
(E cá estou eu, tarada por sapatos).

3.
(Já em idade adulta, enquanto falávamos sobre homens)
- "Uma coisa te digo: nunca penses que mudas um homem, porque nós também não mudamos. Além disso eles não enganam ninguém enquanto namoram connosco: são exactamente aquilo que vão ser dali por trinta anos, nós é que não queremos ver. Nunca me venhas dizer que foi uma desilusão e que não o conhecias: é para isso que o namoro serve. Para as pessoas se conhecerem".
(Palavras para quê? Ainda estou solteira. Obrigadinha por me abrires - demasiado - os olhos)


Um beijo a todas as mães!



10 comentários:

  1. Falaste quase tanto do teu irmão como da tua mãe... lol

    Beijo a todas as mães? Ou só às boas mães?http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1725446&seccao=Sul
    http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=653572

    As mulheres por terem filhos não se transformam em seres melhores... tal como os homens também não. Nem ganham por magia conhecimento em ciências da educação.
    Bem que o Estado podia dar formação aos cidadãos que vão ser pais, era um bom investimento.

    Mas hoje queremos ver tudo com óculos cor-de-rosa!Porém, a verdade está aqui, e serve-se gelada:
    http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=653572

    As mães portugueses são das piores dos países mais desenvolvidos. Triste mass verdade.

    Portanto talvez seja de reveres esse beijo a todas as mães, Dias Cães... ;)
    Mas um beijo para ti vai, pois me pareces uma mulher muito... genuína? Beijo.

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    1. O meu irmão faz parte da minha vivência de filha e, inevitavelmente, do comportamento da minha mãe... até porque ele chegou primeiro.

      Quanto ao resto... ai José... quanto drama e horror! Hoje não estou para isso.
      E apesar de estes casos ocorreram, não são, de todo, aquilo que devemos ter como exemplos de maternidade.

      Não revejo nada os beijos às mães, mas só ficará com eles quem os quiser.

      Beijos para si!

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    2. Não nos conhecemos Dias Cães, somos letras sem rosto, mas deixe-me dizer-lhe que sou muito "do contra"... eheh

      Só quis dar uma perspectiva mais realista. mas respeito a sua vontade e já coloquei os óculos cor-de-rosa... deixe ver... UAU! :)

      Beijos para si também.

      P.S.: Um dia destes entro na sua caixa de e-mail.

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  2. Parabéns pelo texto e pela mãe que tens.
    A terceira história revela uma clarividência que poucos têm.

    Beijos


    P.S.: ia te dizer para não usares o termo terrinha, mas isto ia levar-me muito tempo.

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  3. Obrigada!

    (Mas quero saber porque não devo usar o termo "terrinha"... está-me a escapar alguma coisa?)

    Bj

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  4. Gostei imenso do seu texto. Primeiro pela homenagem que fez à sua Mãe, para mim um texto sublime porque lhe saiu de dentro, das entranhas, e não da circunstância, depois porque se expôs o suficiente para entendermos melhor a pessoa que é!

    Admiro-a pelo que escreveu e tem escrito, por saber regressar às suas origens (à sua terrinha e às suas gentes), pela ternura que hoje aqui mostrou... e eu que sou tanto de emoções!

    Um beijo, se mo permite.

    Raul

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    1. Antes de mais, Bom dia Raul!
      Começar o dia a ler-me é o maior dos elogios.
      É verdade, sem me dar conta, lá me vou expondo.
      Devo meter travão? :)

      beijos.

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  5. Não meta travão naquilo que lhe sai da alma!

    Não há meios amores, nem três quartos... o amor é TUDO.

    Já vi que posso mandar beijos

    Raul

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  6. http://www.youtube.com/watch?v=6CjT9lLvvXA ))

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  7. Grandes dicas de mãe sem duvidas
    Adorei a cena dos sapatos
    Beijos charmosos e obrigado pela pergunta...em breve a resposta

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